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Dos limites da crítica epistemológica à sociologia como práxis - leia o prefácio de Cláudio Pinheiro

Cláudio Pinheiro é professor de Estudos Africanos do Instituto de História da UFRJ (Rio de Janeiro), e Diretor da Sephis (Programa Sul-Sul de Pesquisas sobre a História do Desenvolvimento, Amsterdam); e Professor Visitante Cadeira de Estudos Críticos e Transformação do Ensino Superior na Nelson Mandela University (Victoria, África do Sul). Sua agenda inclui o estudo da escravidão e formas de dependência, e a história da produção e circulação de conhecimento, observando os efeitos duradouros do colonialismo na institucionalização do poder nas sociedades ocidentais e não ocidentais.

A teoria sociológica para além do cânone (Sociological Theory Beyond the Canon) é um marco na história global das ciências sociais. Por isso, e por uma série de outras razões não tão evidentes, é uma grande conquista que este livro esteja sendo traduzido para o português no Brasil.


A maneira mais acertada de ler este livro não é como um texto, mas como um projeto; um projeto que marca a carreira e os compromissos científicos de Syed Farid Alatas e Vineeta Sinha, e do qual ele e ela são artífices tanto quanto produtos. Além disso, este livro conecta as agendas político-acadêmicos de Alatas e Sinha com as pessoas biografadas nele. A forma como apresentam as contribuições de Ibn Khaldun, Karl Marx, Harriet Martineau, Max Weber, José Rizal, Émile Durkheim, Said Nursi, Pandita Ramabai Saraswati, Florence Nightingale e Benoy Kumar Sarkar rejeita a crença de que a mera representação da diversidade redime o cânone sociológico de seu caráter eurocêntrico. Meu argumento é que eles demonstram que alguns dessas e desses pensadores conceberam a sociologia, ou uma multiplicidade de sociologias, enquanto projetos sociológicos politicamente engajados, o que se identifica com a própria forma pela qual Alatas e Sinha se posicionam e atuam nas ciências sociais. Finalmente, este livro aborda a teoria sociológica para além do cânone e, eu sustento, para muito além da decolonialidade. Ainda que a tendência geral seja de acomodar este livro no cerne desse movimento, esse livro consolida um programa que extrapola a assim chamada virada decolonial, particularmente o que esse movimento se tornou na última década.


Publicado originalmente em 2017, A teoria sociológica para além do cânone não apenas acompanhou, mas ajudou a consolidar um dos ciclos mais ricos do debate internacional sobre a teoria sociológica contemporânea. Esse momento enunciava uma “crise” nas ciências sociais – mais uma! – que se traduzia em termos de questionamentos a respeito de sua relevância e capacidade de representação, tendo como consequência a indagação quanto à possibilidade de as ciências sociais falarem universalmente.


Ainda que esses dilemas não fossem exatamente inéditos, os anos 1990-2000 renovaram uma motivação que animou grande parte da comunidade acadêmica internacional: analisar e enfrentar os mecanismos que produzem, e as instâncias que sustentam, desigualdades nas ciências. De forma muito geral, os desafios que se colocavam reconheciam a existência de assimetrias históricas e globais nas ciências sociais e Humanidades e investiam basicamente em duas vertentes: a) as circunstâncias de produção e circulação de conhecimento; e b) sua reprodução e impacto.


O Brasil não esteve alheio a esse movimento. A produção intelectual de muitas e muitos cientistas sociais, como também as redes de intercâmbio que passamos a habitar, caracterizam um momento positivo para as ciências sociais brasileiras. Em 2011, por exemplo, a socióloga australiana Raewyn Connell proferiu a conferência inaugural do 35º encontro anual da Associação Brasileira de Ciências Sociais. Sua palestra – The Coming Revolution in Social Theory – compartilhava reflexões sobre o que ela considerava um movimento em curso para responder a tal crise neste campo. A fala de Connell foi um apelo entusiasmado em favor da reversão de desigualdades na academia internacional, argumentando que as periferias deveriam reivindicar seu lugar na produção intelectual global dominante (Connell, 2012). Naquela altura e nas décadas precedentes, muitos de nós assumimos a produção teórica e nossa capacidade de “teorizar” como grande o desafio para o reposicionamento da periferia nos quadros internacionais da geopolítica científica.


Então, muitas e muitos intelectuais do Sul retomaram o antigo questionamento sobre a capacidade de teorias sociais produzidas no Norte falarem às periferias. Portanto, ao reconsiderar a relevância (traduzida em termos de pertinência ou aplicabilidade) do que se pensava no Norte para observar o que se passava alhures, esse movimento crítico, largamente capitaneado por intelectuais de instituições periféricas, apontava para outras instancias: de falar para, sobre e pelo Sul Global.


Embora talvez soe óbvio que teorias do Norte possam ser inadequadas, inaplicáveis, irrelevantes ou impertinentes para tratar da vida social no Sul Global, nem todo mundo pensou ou pensa assim. Tradicionalmente, intelectuais e cientistas do Sul se obrigaram a responder questões elaboradas por “teóricos” do Norte, ainda que, de fato, essas perguntas não fossem dirigidas diretamente a nós, mas que compusessem um repositório de temas, textos ou métodos definido por grandes pensadores que compunham o cânone disciplinar. Ademais, e é bom lembrar, raramente intelectuais que integram o coração da “teoria clássica” das ciências sociais se interessaram pelo Sul Global. Portanto, isso sugere algo ao mesmo tempo interessante e grave. Se a “grande” teoria social – quase indefectivelmente do Norte – pouco olhou para ou escreveu sobre o Sul, salvo como objeto ou exemplo de incompletude, por que seguimos compelidos a relacionar tudo o que pensamos ao que os “clássicos” pensaram antes? De fato, seria difícil evitá-lo, já que a reputação científica se constrói pela filiação a um debate previamente existente no qual se disputam prestígios e reconhecimentos científicos (Bourdieu, 1986 e 1993; Lamont, 1987; Moore et alii, 2001). Em uma instituição pela qual passei, circulava uma anedota que ajuda a visualizar a forma como o conhecimento produzido no Sul Global é constrangido pela busca por validação de reputações científicas do Norte. Em um exame escrito de um curso de pós-graduação, um(a) professor(a) teria indagado: “Sugira o que diria Max Weber ao ler seu material de campo.”


Essa circunstância enuncia vários dilemas, incluindo questões de representação e da enunciação, advertindo a respeito da irrelevância, do silenciamento e do apagamento de indivíduos e grupos sociais excluídos de diferentes instâncias da narrativa sobre o passado, o presente e o futuro de suas próprias sociedades. Esse argumento foi brilhantemente apresentado pela crítica literária indiana Gayatri Spivak – Pode o subalterno falar? (2010 [1985]) –, que construiu um novo paradigma interpretativo indagando sobre a efetiva capacidade de indivíduos e grupos oprimidos por diversas formas de exclusão social, política ou econômica, de falarem em primeira voz e de terem suas histórias incorporadas à narrativa da nação. Esses indivíduos, grupos e minorias políticas estariam condenados a se expressar somente por intermédio do outro, graças a outros a quem a enunciação está garantida pela posição ocupada em uma hierarquia de poder baseada em economias do privilégio. Essa condenação ajudaria a sedimentar os conceitos de sujeito subalterno e condição de subalternidade, tão bem discutidos pela historiografia indiana dos chamados Estudos Subalternos nos anos 1980-1990.


Diante desses desafios, muitos de nós, intelectuais do Sul, elegemos a “teoria” – e uma compreensão específica do que fosse a teoria – como nossa principal trincheira em batalhas por visibilidade e reconhecimento, representação e posicionamento político, em uma espécie de “guerra” científica do Sul contra o Norte. Diversas disputas dessa guerra denunciavam sistematicamente as inúmeras formas de desigualdade que afetavam as ciências, reduzindo seu potencial de promover transformação e, portanto, sua própria capacidade de promover justiça social e de serem reconhecidas enquanto um bem público fundamental para sociedades democráticas.


Nessa contenda do Sul contra o Norte pelo reconhecimento de legados intelectuais e reputações científicas, um dos pontos mais fundamentais esteve relacionado ao reposicionamento de pensamentos, pensadores e pensadoras periféricos restituídos em seu mérito de ocuparem posições centrais no campo disciplinar. A “teoria” se tornou o espaço de questionamento da hegemonia do Norte frente à sua competência de construir sistemas interpretativos totalizantes, capazes de explicar a vida social como um todo, no mundo todo. A pergunta era: como é possível haver um privilégio de “teorias” que fossem mais “fortes”, “importantes” ou “centrais” e, por conseguinte, capazes de efetivamente explicar como vivemos e quem somos, de falar por todas e todos a um só tempo? Muita gente questionou isso em vários momentos (Ake, 1979; S. Hussein Alatas, 2000; Chakrabarty, 2000; Burawoy, 2005; Connell, 2007; Keim, 2008 e 2011; Kuhn & Weidemann, 2010; Comaroff & Comaroff, 2012; Rodriguez, Boatcă & Costa, 2010; Beigel e Sabea, 2014; entre tantos e tantas).


Esse movimento em defesa das teorias periféricas respeitava, a um só tempo, um esforço de restabelecer teóricos e teorias esquecidas (porque apagadas) e provar nossa capacidade de teorizar. Mas será que podíamos teorizar? Essa revisão crítica passou a observar mais de perto o que, a princípio, se considerava “teoria” (Costa, 2010; Rosa, 2014 e Rosa e Ribeiro, 2021). Muita coisa acabou acomodada sob esse rótulo, mesmo sem ser exatamente teoria, incluindo várias premissas científicas básicas que orientam a forma como conhecemos, pensamos, pesquisamos ou escrevemos: metodologia, heurística, episteme etc.


Certamente a resposta para o dilema da busca por validação de reputações intelectuais não é simples. Por um lado, a história da consolidação de campos científicos em um modelo institucional humboldtiano enfatiza a narrativa de uma trajetória de campos científicos europeus sobre como determinadas áreas se autonomizaram umas das outras – a linguística, a história, a sociologia, a química etc. – ensejando a formação de universidades, departamentos, a contratação de professores e a própria criação de histórias institucionais da ciência.


Ademais, o imperativo por vernaculizar o conhecimento produzido no Norte para um consumo científico e social no Sul Global é antigo e, em não poucos casos, consagrou carreiras de vários e várias intelectuais da periferia. Isto é, traduzir, introduzir, adaptar e explicar autores, autoras e ideias centrais da disciplina para audiências periféricas tem sido um percurso fundacional das ciências sociais em seu caráter colonial e proselitista. Esse expediente cria legitimidades científicas e instâncias de poder, tanto para o autor traduzido e apresentado quanto para quem se dedica a fazê-lo. Exemplos desse tipo de expediente transbordam.


Traduzir e apresentar configuram uma prática acadêmica tanto quanto fazem parte de uma estrutura de poder da disciplina que consagra trajetórias profissionais, o que é marcadamente visível na publicação de autores centrais por editoras e academias periféricas (Connell, 1997 e 2011; Rosa e Ribeiro, 2021). No caso brasileiro, e de tantas outras periferias intelectuais, o esforço por editar “clássicos” em empreitadas como as coleções Os Pensadores, da editora Abril, ou Grandes Cientistas Sociais, da editora Ática (Aurélio, 2015), publicadas entre os anos 1970 e 1980, ajudou na tarefa de inventar e consagrar textos e nomes da sociologia mundial ao mesmo tempo em que construiu especialistas (patronos e patronas) na exegese de determinados textos, autores ou temáticas. Importa salientar que os tais Pensadores se restringiam a europeus, alguns estadunidenses e uns quantos gregos que nos eram inculcados como santos de uma igreja que constituía a matriz fundadora de “nosso” pensamento e de “nossa” civilização. E isso não era restrito à “torre de marfim” que a intelectualidade e a universidade constituíam. A coleção Os Pensadores era vendida em bancas de jornal, de acesso público e amplo a qualquer pessoa que se interessasse por saber quem era ou o que escreveram Platão, Aristóteles, Émile Durkheim ou Bronislaw Malinowski.


Coleções como Os Pensadores existiam na casa de muitas famílias brancas de classe média urbana no Brasil dos anos 1970-1980, mesmo que as pessoas que adquiriam esses volumes jamais fossem ler sobre filosofia grega, economia norte-americana, sociologia francesa ou antropologia britânica escrita por um polonês. Compunham altares decorando as estantes da sala de estar como uma marca de distinção, mas, acima de tudo, como sinal de escolaridade e civilidade. Assim, em grande medida, nós do Sul contribuímos ativamente para canonizar autores do Norte, renovando privilégios de raça, gênero ou classe social e posicionalidade. Políticas de tradução e edição amparam estruturas de dependência acadêmica, especialmente ativas no reforço de clivagens que separam centros e periferias. A tradução e apresentação de obras, autores e ideias em contextos periféricos renovam nossa condição periférica. Enquanto esses expedientes reforçam o caráter de distinção que tem a apresentação do novo, do inédito, do moderno, relembram o quanto somos obsoletos, pois inventam sociologias (ou historiografias) hipsters, que nos modernizam a partir do ultrapassado e sem, de fato, promover mudança (Pinheiro, 2023). Alguém poderia ir mais longe e dizer que muitos e muitas cientistas sociais na periferia se contentaram em desenvolver obras identificadas pela tradução (Rosa e Ribeiro 2021), adição (Costa 2010) ou pela mimesis (Taussig 1993) como estratégia de carreiras singularizadas pela transferência de prestígios.


Em contrapartida, o empenho por questionar a centralidade de teorias do Norte, por resgatar contribuições críticas de autores e autoras obliterados, e por produzir “novas teorias”, convergiam ânimos gerais por reverter estas estruturas de desigualdades históricas. Esse movimento passou a vasculhar referencias de cientistas sociais do Sul Global que haviam produzido teorias relevantes para pensar o Sul e – por que não? – o próprio Norte. Começamos a ler avidamente pensadores e pensadoras que, a partir do Sul, refletiram sobre nossa condição periférica, indicando como isso fala de uma estrutura que, ao fim, sustenta desigualdades, em especial a nossa possibilidade de pensar e falar sobre nós mesmos. Ademais, e diante da possibilidade de falarmos, que pudéssemos ser efetivamente ouvidos para além de nossas fronteiras locais, nacionais ou terceiro-mundistas. Buscar inspiração em pensadores periféricos, que haviam refletido sobre nossa condição periférica, foi fundamental para elaborarmos outras teorias no presente (mesmo que não fossem exatamente teorias). Isso motivou inúmeras pesquisas sobre a história das ciências sociais, da teoria social e do que, em termos gerais, se convencionou chamar de “pensamento social”: um espaço ocupado por pessoas que, com uma trajetória acadêmica formal ou não, refletiram e escreveram sobre a formação e o funcionamento de sociedades.


A teoria foi convertida em arma para reclamar nosso passado das entranhas de narrativas eurocêntricas, como expuseram Farid Alatas e Vineeta Sinha (2001: 326). Meu argumento é que a leitura de A teoria sociológica para além do cânone anuncia uma nova hermenêutica de intelectualidades subalternizadas, organizada a partir de uma práxis sociológica que apresenta às ciências sociais outros projetos políticos. Esta perspectiva reconhece a conversão da teoria em objeto e plano de disputas, mas também a “arma da teoria”, no que se alinha ao sentido dado à expressão por Amílcar Cabral (1980 [1976]: 26 e 47), como partes de uma “aliança permanente e dinâmica” na qual prática e teoria se fecundam mutuamente para produzir a revolução esperada por Raewyn Connell em 2011, ou uma mais transformação mais radical e profunda, como proposta por Cabral (1980 [1976]).


Enquanto a teoria era posta em xeque, e mesmo instâncias como a metodologia (Tuhiwai Smith, 1999) e epistemologia (Fricker, 2007; Bhargava, 2013) eram confrontadas por críticas contra a hegemonia eurocêntrica, passamos a questionar a forma como uma estrutura de cânones disciplinares armazena desigualdades perduráveis transmitidas, sobretudo, a partir de protocolos e práticas de ensino dedicadas a formação de novas gerações. Uma das premissas básicas é que o ensino do “pensamento social”, da “teoria sociológica” e das ciências sociais como um todo, se relacionam à forma como nos vemos a nós mesmos, individual e coletivamente, e à capacidade dessas mesmas ciências incorporarem a diversidade de formas de ser e de pensar sobre as sociedades.


Por outro lado, a medida em que produzíamos releituras informadas sobre teorias sociológicas, e críticas consistentes ao proselitismo epistêmico eurocêntrico razoavelmente alinhados a um campo da poscolonialidade, percebíamos que isso não seria suficiente. Para confrontar a dependência acadêmica, reduzir a desigualdade e produzir ciências sociais mais equânimes, seria necessário acercar outras instâncias, o que incluía reconsiderar como o conhecimento era reproduzido e disseminado. Protocolos e práticas do ensino de ciências sociais incidem em várias dimensões de poder pois, ao definirmos conteúdos e rotinas pedagógicas – ou seja, sobre o que e como ensinamos – ajudamos a consolidar a identidade de uma disciplina dedicada ao enfrentamento de questões e temas historicamente consagrados por uma “teoria clássica”, autores e textos reconhecidos como fundadores das ciências sociais. Portanto, a definição de conteúdos de ensino cristaliza hierarquias globais da disciplina – em termos de temas, textos, intelectuais e questões prioritárias na agenda de enfrentamento – e incide em uma das tarefas mais nobres da disciplina: a formação de novas gerações de intelectuais e o exercício de uma certa consciência crítica da sociedade.


Essas dimensões ajudam a compreender a natureza e o poder do cânone disciplinar da teoria sociológica clássica, como um “mito de origem, uma história fundacional que serviu para unificar e legitimar um projeto fragmentário e moralmente dubio” (How, 2007: 6), e criar solidariedades em torno de uma comunidade epistêmica.


Revisitando os clássicos e desparoquializando o cânone


A expectativa de redefinir o cânone disciplinar e de observar campos de conhecimento para além de enquadres eurocêntricos não é nova nem, muito menos, monopólio das ciências sociais e das humanidades. Para a teoria sociológica, o cânone se configura a partir da agenda definida pelos “clássicos”: uma lista de autores europeus que, entre os séculos XVIII e princípios do XX, se dedicou a interpretar as mudanças sociais que afetaram a construção da modernidade ocidental e do capitalismo. Junto com a interpretação, esse processo ajudou a definir autores, temas, métodos, questões-chave, conceitos, epistemes etc., centrais do que ficaria conhecido como sociologia.


A definição do cânone não é um fato dado, mas um processo em constante reelaboração já que esse cânone também é objeto de contínuas disputas políticas. Ao mesmo tempo que definia temas, métodos, questões-chave, conceitos, epistemes centrais da disciplina, estruturou arquétipos de trajetórias profissionais exemplares e modelos do que é ser sociólogo, incluindo as qualidades e características essenciais de um “bom” teórico social. Este último aspecto ajudou a estruturar a teoria sociológica clássica em torno de autores centrais e terminou consagrando uma hagiografia da disciplina (uma espécie de biografia dos santos da sociologia) a partir de princípios do século XX (Bourdieu, 1976; Platt, 1995; Wallerstein 1996, Connell, 1997).


Este processo enseja uma curiosa conexão entre a sociologia e uma moral religiosa cristã que transparecem em aspectos que habitam o cerne da teoria sociológica clássica, ordenada a partir de um cânone, estruturas narrativas e formas de exegese próprias de uma experiência histórica eurocentrada. Essa conexão é mais evidente em alguns pais fundadores que, a despeito de europeus, foram sacados do núcleo central dos clássicos, como Henri de Saint-Simon e Auguste Comte. Enquanto o primeiro propôs que a sociologia se consolidaria como a ciência cosmopolita de um novo industrialismo econômico global, sustentado um cristianismo secularizado (como arcabouço moral da unidade europeia), e o socialismo sustentando uma noção de unidade universal da disciplina; o segundo levou adiante esse programa, defendendo a sociologia como uma “religião universal e força coesiva das ciências contemporâneas” (Turner, 1997: 346). Na mesma linha Jeffrey Alexander analisava o marxismo como uma religião secularizada e defendeu uma sociologia marcada por uma matriz religiosa submetida a um desafio hermenêutico do cânone que define textos legítimos e apócrifos, bem como uma lista dos santos dessa igreja (Alexander, 1987: 338-339; Connell, 2019). Curiosamente um dos primeiros e mais importantes manuais da disciplina, Introduction to the Science of Sociology, de Robert Park e Ernest W. Burgess (1921), ganhou o apelido de a “Bíblia Verde” da sociologia (Connell 1997). Embora ainda insuficientemente analisada, sociologia como projeto de uma religiosidade secularizada, está marcada por um vocabulário cristão, utilizado para descrever operações básicas de composição de cânones disciplinares: “divinização”, “conversão”, “consagração”, “redenção”, “a santa Trindade”, hagiografia, dogmas, a hermenêutica, a exegese etc (Pinheiro 2023).


A partir desse quadro, uma melhor avaliação da perenidade de modelos intelectuais modernos escolásticos sobre a formação de uma teoria sociológica clássica pode inspirar um entendimento mais qualificado dos dispositivos de narrativa e de construção de personalidades acadêmicas, caracterizados por empréstimos de prestígio e sustentados por mecanismos de transmissão de autoridade e de carismas, como o princípio da auctoritas. Observar essa circunstância ajudaria a analisar como a narrativa da história da teoria social e do pensamento social organizam uma comunidade em torno de uma prosopografia que identifica trajetórias e características em comum, e que canonizou reputações, em torno de hagiografias da disciplina. A crítica à prevalência silenciosa de uma matriz moral cristã na escrita de histórias das ciências sociais e na canonização de seus clássicos, comparece evidente no programa de pesquisa e mobilização acadêmico-política de Farid Alatas e Vineeta Sinha, como veremos abaixo.


Nos anos 1990, questionamentos sistemáticos sobre a exemplaridade da experiência europeia na composição da estrutura clássica da teoria sociológica foram acompanhados de revisionismos a respeito da centralidade dessa experiência histórica como modelo frente a outras matrizes civilizacionais. Esse foi o caso das provocações de Dipesh Chakrabarty, Partha Chatterjee e Sergei Eisenstadt, que desafiaram a noção unívoca de modernidade, lembrando que história da modernidade e do capitalismo não eram sinônimos de história europeia – Provincializing Europe (2000), Our Modernity (1997) e Multiple Modernities (2000), respectivamente. Como apontam Alatas e Sinha (2017), se assumirmos que pensadores europeus foram influenciados por seu tempo e sociedade, seria razoável considerar que pensadores não-europeus (e não-brancos e não-homens) estariam preocupados com aspectos que afetaram outros mundos, tempos e sociedades. Esse tem sido um desafio importante, considerando que essa estrutura de cânones da teoria sociológica resiste em reconsiderar a relação entre valores sociais, objetividade e investigação científica (Longino, 1990) de forma a reconhecer o valor da diversidade enquanto um bem público central para sociedades democráticas (Callon, 1994) e para a ciência. A ausência de diversidade, sustentada pela manutenção de regimes de privilégio observáveis na distribuição desigual de recursos (teorias, métodos, capacidades, oportunidades de emprego ou financiamento a pesquisa), ampara formas de precariedade e leva à constituição de minorias científicas, prejudicando a ciência e a sociedade em muitos aspectos. Um dos dilemas reforçados pelo chamado pensamento decolonial foi fazer-nos acreditar que promover a representação da diversidade (de fato, de uma compreensão específica de seja a diversidade) seria o suficiente para liberar as ciências do eurocentrismo, desfazer a colonialidade, e promover uma distribuição justa de reputações intelectuais.


Importante reconhecer que tanto a composição do cânone das ciências sociais quanto sua reprodução e, em alguma medida, a agenda e os protocolos de ensino deste campo já vinham sendo abordados com alguma sistemática por diversos autores e autoras ao longo de décadas anteriores (Turner, 1990; Parker, 1997; Mouzelis, 1997; Connell, 1997; Scaff, 1998; Boyers, 2000; Albers, 2003; Thomas e Kukulan, 2004; Reed, 2006, Golding e Kopsick, 2021, veja-se também a resenha de Weiss, 2022). Um dos espaços preferenciais de observação desses mecanismos de silenciamento, invisibilização e consolidação de estruturas de poder no ensino de ciências sociais foram as ementas e programas de curso universitários de graduação e pós-graduação. Estudar esses documentos pedagógico-burocráticos ajudou a demonstrar como eles constituíam instâncias de poder disciplinar que materializavam, inclusive de forma muito gráfica, ao mesmo tempo que canonizavam um altar de nomes de pais fundadores da disciplina. Estudar ementas ajudou a denunciar o eurocentrismo, o sexismo, o racismo, e outras forças que repelem a presença de diversidades ao mesmo tempo que consolidam uma narrativa das origens ocidentais, masculinas e brancas do campo.


Ao longo do tempo, e em linhas gerais, as provocações ao cânone vem incidindo em algumas tendencias, que vão: a) da defesa da manutenção de um cânone disciplinar de viés eurocêntrico, baseado em autores e textos clássicos do Norte (Mouzelis, 1997), em oposição ou não a contemporâneos, “alternativos”, “emergentes”, periféricos, contestatórios etc.; b) de críticas que sugerem que a disciplina ganharia mais se abolisse totalmente o compromisso com um cânone disciplinar (Beck, 2000; Beck e Sznaider, 2006); e c) de argumentos pela reforma do cânone da teoria social, que pode se traduzir em propostas de ampliação (Parker, 1997), descentramento (Pickering, 2005; Utt, 2018), distribuição (Rubinstein, 1988), não-exemplaridade (Rosa, 2022) desparoquialização (Alatas, 2021) e, claro, sua decolonização. Movimentos de contestação de uma sociologia clássica que define o cânone a partir de seu núcleo franco-germânico do século XIX, tem acontecido a partir de vagas constantes, nos anos 1990, 2000 e nas décadas seguintes (Inglis 2009) e tem ressaltado a importância de redimir a disciplina da presença de diversidades de gênero (Reed, 2006; Jurik e Simen 2009; Daflon e Campos, 2022), raça (MacLean e Williams, 2008; Morris 2015; Burawoy, 2021), casta ( e outras instancias da ausência de uma justiça epistêmica distributiva.


O compromisso de Farid Alatas e Vineeta Sinha com esse movimento crítico não se inicia com nem se limita à publicação desse livro. Enquanto reconheciam a importância de autores clássicos do cânone disciplinar, Alatas e Sinha produziram novos engajamentos teóricos, metodológicos e políticos capazes de renovar as ciências sociais. Alatas, em especial, elaborou um repositório de conceitos-chave que descrevem e analisam as formas de assimetria e os mecanismos de sustentação de desigualdades acadêmicas globais. Alguns desses conceitos se tornariam inspiração para uma geração de pesquisadores e pesquisadoras, além de armas em diversas batalhas científicas do Sul contra o Norte, como “pensamento autônomo” (debate no qual seu pai investiu – S. Hussein Alatas, 1972 e 2002), estruturas de “dependência acadêmica” (Alatas, 1999, 2003, 2008; Sinha-Kerkhoff e Alatas 2010) ou “discursos alternativos” (Alatas, 2001, 2006 e 2010a), entre outros.


A partir dessa plataforma, considerar os interesses de pesquisa e escrita desses autores oferece uma chave analítica para observarmos a maneira como se aproximam da discussão sobre o cânone da sociologia. Embora ambos tenham agendas de investigação amplas, coincidem em dois eixos principais: estudos sobre religião, as próprias ciências sociais e o cruzamento entre estes campos. Enquanto Alatas observa uma sociologia do Islã, o pensamento islâmico clássico ou o diálogo inter-religioso a partir de um ponto de vista de uma teologia política e de uma certa filosofia da sociologia, Sinha investe em uma antropologia com forte compromisso etnográfico para explorar a relação entre religiosidades e nação em comunidades transnacionais, incluindo a mobilidade e plasticidade de práticas e crenças religiosas no espaço asiático do Sul e do Sudeste. No caso dela, o contato entre práticas religiosas de diferentes matrizes ajuda a explorar experiências de fusão de representações, espaços e práticas do sagrado (Sinha, 2003), da mobilidade de práticas religiosas e de deuses ou até da criação de novos deuses na diáspora hinduísta (Sinha, 2005). Já Farid Alatas toma o Islã como uma matriz civilizacional e sociológica (Alatas, 2013), a partir da qual ele recorre a escritos de autores muçulmanos para observar uma sociologia islamicamente orientada em termos de conceitos e teorias da organização social, como a Muqaddimah de Ibn Khaldun (1990; 1993; 2006; 2013; 2014; 2016 etc), ou uma teologia social como crítica da civilização moderna de Said Nursi (2010b e 2017).


Explorando com a matriz cristã no cerne do cânone sociológico à qual esta discussão está associada, o movimento proposto por Alatas e Sinha não se opunha a que as ciências sociais fossem constituídas por uma certa hagiografia ou que tivessem um altar, nem mesmo santos. Ele e ela não desabilitaram a Igreja clássica nem desqualificaram seus santos e as orações de invocação. Seu compromisso, por outro lado, revê criticamente essa hagiografia clássica, mostrando que mesmo os santos patronos (os autores clássicos da sociologia) tinham sido submetidos a uma redução de sua contribuição e que, por outro lado, havia mais santos, santas e mesmo deuses de outras religiões – para além da matriz cristã – que estariam aptos e aptas a compor o altar da disciplina. O movimento que desenvolvem não é simplesmente qualificar o cânone da teoria sociológica para depois reformá-lo. Ao contrário, propuseram-se a revisitar os pais fundadores por meio de escritos diferentes daqueles que os garantiram sua canonização e convidar novos nomes para chamarmos de clássicos.


A origem do projeto e o impacto desse livro


Observando o peso e o impacto que A teoria sociológica para além do cânone tem tido no arcabouço internacional das ciências sociais, mesmo quem não entenda nada do assunto adivinha que o projeto que culminou nesta publicação não foi feito da noite para o dia, nem em três meses. A teoria sociológica para além do cânone é o produto de mais de três décadas de acúmulo continuado de reflexões, debates, eventos e publicações sobre teoria, epistemologia e práticas de ensino das ciências sociais.


Alatas e Sinha identificam a origem do projeto deste livro em 1998, quando começaram a lecionar juntos o módulo de “Teoria sociológica clássica, pensamento social e teoria social” para estudantes de graduação no Departamento de Sociologia da Universidade Nacional de Cingapura (2017, vii). Entretanto, a semente de algumas ideias desenvolvidas na publicação era evidente em alguns dos artigos que ambos haviam publicado mais de 10 anos antes. Isso se deu a partir de dois desafios: a) o questionamento do campo sociológico internacional quanto ao compromisso implícito com a manutenção de hegemonias politico-acadêmicas e financeiras representadas, especialmente, por um ideal eurocêntrico; e b) o questionamento dos mecanismos de apagamento, invisibilização, desqualificação e silenciamento de intelectuais que, de uma forma ou de outra, se desalinhavam do perfil étnico-racial, de classe, casta ou gênero, a que pertenciam os autores estabelecidos das ciências sociais globais. Esses dois eixos estão orientados por estruturas e práticas de “dependência acadêmica” (Alatas, 2003) que ordenam e sustentam assimetrias e desigualdades cientificas globais. Um dos aspectos que podemos visualizar nesse movimento é o questionamento sobre: o que mais estava sendo apagado junto com os nomes e obras de determinados autores e autoras não-brancos, não-homens e não-centrais da disciplina?


Resultados preliminares desse projeto foram discutidos entre os autores, no contexto do departamento de sociologia da Universidade Nacional da Cingapura, ou em fóruns e em grupos de trabalho. Para Vineeta Sinha e Farid Alatas, alguns dos pontos fundamentais incorporados no livro vieram das discussões provocadas por experiências de ensino compartilhado de sociologia clássica em uma grande universidade de um jovem país rico, porém periférico. Sua preocupação inicial era muito prática: como conciliar a obrigatoriedade de lecionar sobre Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim como cânone fundacional da disciplina com as preocupações teóricas de ambos, tornando esses autores e temas relevantes para seus estudantes na Cingapura? E como rebater a infertilidade e irrelevância da disciplina na sua capacidade de inspirar outros contextos sociais não-centrais e não-eurocêntricos?


Embora a contestação do compromisso tácito do cânone das ciências sociais internacionais com o eurocentrismo esteja presente em diversos escritos de Farid Alatas e Vineeta Sinha ao longo dos anos 1980-1990, essa é uma agenda herdada de outras gerações e transmitida por práticas de ensino e pelo engajamento político de intelectuais como Claude Ake (Nigéria, 1939-1996), Wim Wertheim (Holanda, 1907-1998) ou Syed Hussein Alatas (Malásia, 1928-2007), pai de Farid Alatas.


Desde os primeiros escritos de ambos nos anos 1980-1990, compromisso fundamental de contestar a hegemonia eurocêntrica nas ciências sociais está evidente (Sinha, 1997), ressaltando que o debate teórico incluía dimensões práticas de uma crítica pós-moderna e pós-colonial (Sinha, 2000a). No caso de Farid Alatas, recolocar conceitos e projetos islâmicos de ciências sociais é um dos aspectos que marca sua obra, alinhando-o com o legado intelectual de seu tio e seu pai em torno da islamização do conhecimento (Al-Attas, 1978) e sacralização das ciências sociais (Alatas, 1995). Seus primeiros artigos lidavam com questões e teorias da islamização (Alatas, 1985), da economia (Alatas, 1987a) e das ciências sociais (Alatas, 1987b). São também desse período, e alinhadas a esse espírito, as primeiras tentativas de uso dos escritos de Ibn Khaldun para revisitar temas-chave da teoria sociológica (Alatas, 1990 e 1993b), desde os modos de produção (Alatas, 1990 e 1993a) até as dinâmicas sociais (Alatas, 1993), o que culminaria não apenas em uma reflexão sobre o lugar de Ibn Khaldun no cânone da sociologia como em propostas de uma sociologia propriamente khalduniana e muçulmana (Alatas, 2016).


Também no princípio dos anos 1990, Sinha e Alatas começavam a questionar o apagamento de intelectuais periféricos e/ou que não se figuravam no cânone sociológico internacional. Assim surgiram os primeiros escritos sobre Ibn Khaldun (Alatas, 1990 e 1993) ou sobre a prevalência do androcentrismo nas ciências sociais, analisado a partir da obra de Harriet Martineau (Sinha, 2001 e 2007). A agenda de Vineeta Sinha permite ainda traçar paralelos entre seus estudos a respeito de religiosidade popular e de práticas religiosas e espaços de “fusão de crenças” em Cingapura e os processos de canonização de intelectuais. Essa é exatamente a linha que congrega o interesse por religião/religiosidade e pelas condições de produção e reprodução de conhecimento nas ciências sociais diante do estudo e do enfrentamento das formas de desigualdade na ciência. Esse compromisso não se traduz apenas em uma agenda de pesquisas e publicações, já que também se faz visível em seu compromisso com políticas de ensino e de formação de novas gerações de intelectuais – ou seja, em termos de docência, orientação e mecanismos institucionais de construção de carreiras. Ademais, e não menos importante, ele também se traduz em seu engajamento com a comunidade científica internacional em termos da consolidação de uma agenda institucional em associações de representação de classe, como a International Sociological Association.


Em 2001, Alatas e Sinha publicaram Teaching Classical Sociological Theory in Singapore, seu primeiro artigo conjunto refletindo sobre a urgência de repensar o ensino do currículo da sociologia clássica, dadas as preocupações que partilhavam quanto à limitação do cânone teórico em circulação. Sua observação era que as críticas ao compromisso eurocentrista na teoria clássica das ciências sociais estavam sendo bem colocadas, mas, até aquele momento, isso não havia sido traduzido em práticas capazes de reverter aquele estado de coisas. Como eles mesmos pontuaram: “convites para descolonizar as ciências sociais geralmente não foram seguidos de tentativas bem-sucedidas de construir teorias ‘indígenas’ ou tradições autônomas das ciências sociais desconectadas do núcleo acadêmico da Europa Ocidental e Estados Unidos” (2001, p. 316). Isso se dava, em especial, porque as práticas de ensino correspondem a uma dimensão poderosa de reprodução do cânone da teoria sociológica.


Desde 2017, quando foi lançada a versão original em inglês, A teoria sociológica para além do cânone tem tido uma recepção e um impacto global notáveis. Ao longo de pouco mais de cinco anos, o livro teve ao menos dez resenhas positivas publicadas em árabe, croata, francês, inglês e português e em periódicos acadêmicos e em jornais de circulação ampla na Inglaterra (Dawson, 2017 e Izharuddin, 2019), em Bangladesh (Bin Ali, 2018), nas Filipinas (Nario-Lopez, 2018), no Brasil (Antonio, 2019; Oliveira, 2020 e 2022), nos Estados Unidos (Lowery, 2020), na Croácia (Šarić, 2022) e no Qatar (Izharuddin, 2022).


Além de um sensível impacto sobre o debate acerca de trajetórias disciplinares das ciências sociais ou sobre as estruturas de poder que produzem e sustentam desigualdades perduráveis nas ciências sociais internacionais, este livro tem inspirado publicações semelhantes – reeditando e/ou comentando autores e obras excluídas – somando-se ao esforço de superar os limites reducionistas de cânone da teoria social: Zavala Silva (2021), Daflon e Sorj (2021), Daflon e Campos (2022), entre outros.


Esse compromisso também ecoa na revisão de práticas de ensino, especialmente em sua dimensão mais objetivável: a revisão de ideais de representação da diversidade por meio de ementas de curso de universidades centrais do Norte e das de contextos periféricos do Sul Global. Uma constatação notável, embora não tão surpreendente, é de que a divulgação e o uso de A teoria sociológica para além do cânone como ferramenta de ensino crítico das ciências sociais foi uma tarefa capitaneada por intelectuais periféricos (mesmo que trabalhando em universidades centrais) e só posteriormente incorporada por acadêmicos e instituições do mainstream internacional das universidades do Norte. O primeiro uso do livro em sala de aula, veio pela professora Eloísa Martín (Departamento de Sociologia da UFRJ), quando era professora visitante do departamento de sociologia da Universidade Livre de Berlin (Freie Universität de Berlin, Martin 2017/18), no curso de mestrado “To open the sociological theory: geopolitics of knowledge and the non-canonical classical sociology” (Para abrir a teoria sociológica: a geopolítica do conhecimento e a sociologia clássica não canônica). A partir disso, foi circulando entre colegas e ganhando amplitude global. Uma lista não exaustiva a respeito da incorporação da A teoria sociológica para além do cânone em cursos universitários inclui: Freie Universität de Berlin, Alemanha (Martin, 2017/18; Motta e Costa, 2018/19); Ibn Haldun University de Istambul, Turquia (Aras, 2019/20); curso conjunto envolvendo a UFRJ (Brasil), Wellesley College (Boston) e Harvard University (Massachussetts) (Pinheiro e Levitt, 2019/20, 2020/21); University of Panjab, Paquistão (2021); Graduate Institute, Suíça (Roggers, 2021/22); Science Po, França (Dufoix, 2021/22); Goldsmith University, Inglaterra (Smith, 2022/23); e University of Sussex, Inglaterra (Whillis, 2021/22; Hall, 2022/23). Assim, livro tem sido lido em cursos/departamentos de sociologia, história, estudos de paz e justiça, mídia, modernidade e pensamento, sociologia e antropologia, além de debatido em inglês, português, alemão, francês, árabe, turco e urdu.


Conclusão


Desde princípios do século XX, a hagiografia de santos-pais fundadores da teoria sociológica tem sido marcada por um machocentrismo branco – “White malestream” (Maclean e Williams, 2008: 599). Uma revisão crítica dessa narrativa hegemônica preconceituosa, preocupada em restituir a relevância universal das ciências sociais, pressupôs a expiação do eurocentrismo, aliada a redenção da capacidade de periferias acadêmicas de teorizar. Além disso, também inclui a realização de hermenêuticas críticas dos textos e autores fundadores da disciplina que restituam diversidades invisibilizadas, denunciando e contradizendo a expectativa de que a teoria sociológica represente a história da supremacia de um modelo de intelectualidade baseado num cristianismo branco secularizado. Finalmente, este compromisso reconhece que protocolos e práticas de ensino ajudam a solidificar hierarquias intelectuais divididas entre centros e periferias acadêmicas, constrangendo a imaginação sociológica e a criatividade intelectual, e afetando a cognição como um todo.


A teoria sociológica para além do cânone se alinha a estas premissas, enfatizando que o espaço e as práticas de ensino de ciências sociais foram progressivamente apagando os registros da diversidade, entendida como a representação de diferentes vozes, cores e gêneros do pensamento. Ao obliterar pensadores, pensadoras e ideias, sobretudo periféricos, a sociologia relembra sua origem paroquial comprometida com a exemplaridade da experiencia histórica europeia. Farid Alatas e Vineeta Sinha não são os primeiros a contestar este machocentrismo branco eurocêntrico do cânone da teoria social. Na sua expressão mais evidente, a proposta do livro se assenta basicamente em três eixos: a) revisitar os clássicos (pais fundadores) restituindo maior envergadura a seus textos e projetos sociológicos; b) rememorar e incluir outros nomes, gêneros, cores, classes sociais e castas de pensadores e pensadoras renegados do cânone hegemônico da disciplina; c) expiar o eurocentrismo da raiz mais profunda da sociologia.


Entretanto, se equivoca quem imagina que a contribuição do livro vai até aí e que defende que o grande mérito desse livro é restituir a diversidade de vozes periféricas ou não-hegemônicas (por que não-masculinas, não-brancas e não-participantes do mainstream) ao cânone central da sociologia (Pickard, 2018). Alatas e Sinha realizam isso e muito mais. Uma grande contribuição do livro, eu sustento, talvez seja o compromisso de apresentar esses autores biografados não como textos, mas a partir dos compromissos que enquadram sua produção de conhecimento à projetos intelectuais politicamente engajados. Portanto, ao mostrarem que convivemos com um quadro político-científico produzido por um processo de apagamento de pensadores, pensadoras e formas de pensar, este livro mostra que a consolidação de um cânone da teoria sociológica clássica e do pensamento hegemônico pressupôs o apagamento de formas social e politicamente engajadas com a produção de conhecimento e, consequentemente, invisibilizaram uma multiplicidade de projetos político-intelectuais inclusivos e de promoção de justiça social. A história de estruturação das ciências sociais contemporâneas, com a qual ainda convivemos globalmente, consagrou uma compreensão, em larga medida, desracializada e destituída de gênero ou classe, do mundo social que não corresponde a realidade.


Assim, eu defendo, a proposta de Alatas e Sinha evita reduzir intelectuais, suas obras, trajetórias e seus projetos científico-políticos à tokens de representação da diversidade, afastando-se de uma hermenêutica que encapsula autores não-brancos e periféricos em uma estrutura branca que higieniza o campo da sociologias múltiplas relacionadas a projetos sociológicos politicamente engajados transformando-os em “teorias”, expediente que caracteriza grande parte das histórias ou sociologias da sociologia alinhadas com a virada decolonial e, as práticas correntes de ensino de teorias sociológicas ao redor do mundo. A força e importância deste livro reside no empenho de restituir à teoria social, à teoria sociológica e, por associação, à própria Sociologia o seu potencial transformador, orientados por um compromisso coletivo mais amplo assentado no bom diagnóstico científico das condições de produção da desigualdade. Tudo isso que Alatas e Sinha apresentam no livro não se dá através de uma análise sociológica do cânone, mas de uma defesa de novos protocolos de ensino.


Para onde avançar? A revisão de práticas de ensino, tem sido largamente compreendida como a revisão do repositório de textos usados para o treinamento de novas gerações de cientistas sociais e para uma revisão crítica das estruturas de poder da disciplina. Entretanto, é insuficiente para revisar o papel do ensino na sustentação de assimetrias Norte-Sul na produção de conhecimento. Em geral, em muitos lugares do mundo, autores periféricos, invisibilizados, apagados tem sido inscritos (ou reinscritos) no cânone disciplinar como parte de um projeto disciplinar e compromisso libertário de desfazimento dos prejuízos da experiencia colonial – a decolonialidade. Entretanto, como já ressaltei acima, essa restituição não ensejou uma nova prática de ensino, se não, quando muito, um protocolo pedagógico que converte trajetórias e existências em texto que volta a satisfazer um modelo intelectual baseado em uma estrutura clássica eurocêntrica, largamente cristã, de análise hermenêutica.


A teoria sociológica para além do cânone é produto de uma prática de pedagogia crítica, desenvolvida e praticada ao longo de mais de duas décadas e que foi concebido como um manual para uso em sala de aulas. Esse livro constitui uma ferramenta que une teoria e práxis, tal qual expressado por Amílcar Cabral (1980 [1966]) em um compromisso de produzir um novo momento e pacto para a produção de conhecimento e, sobretudo, para rever a resistência da desigualdade e de assimetrias nas estruturas de poder das ciências sociais.



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LOWERY, Grady.Book review: Syed Farid Alatas and Vineeta Sinha, Sociological Theory Beyond the Canon. Critical Research on Religion, 8(3), pp. 324-327. 2020.


NARIO-LOPEZ, Hannah Glimpse. Looking Beyond the Shoulders of Giants: Remaking Sociological Theory, Reviewed Work: Sociological Theory Beyond the Canon by Syed Farid Alatas, Vineeta Sinha. Philippine Sociological Review, Vol. 66 (2018), pp. 103-108. 2018.


OLIVEIRA, Lucas Amaral de. A crítica do cânone e as sociologias alternativas. Resenha: Syed Farid Alatas and Vineeta Sinha, Sociological Theory Beyond the Canon. Afro-Asia. 2020, n. 61: 424-437. 2020.


ŠARIĆ, Marija. Book review: Syed Farid Alatas and Vineeta Sinha, Sociological Theory Beyond the Canon. Croatian Sociological Review, 52(2), pp. 239-241. 2022.


Programas de curso que incorporam A teoria sociológica para além do cânone


Aras, Ramazan. Social Theory I. School of Humanities and Social Sciences Department of Sociology, Ibn Haldun University (Istambul, Turquia). 2019-2020.


Dufoix, Stephane. Decolonizing Sociology. Departamento de Sociologia, Science Po, França. 2021-2022


Dufoix, Stephane. The World Social Science Archipelago Some Contemporary Issues In The Epistemology And History Of The Social Sciences. University Paris-Cité (França). 2023.


Hall, Oliver. Themes and Perspectives in Sociology 1. Departmento de Sociologia, Universidade de Sussex, 2022-2023.


Loyola College (Chennai, India). Classical Sociological Theory. Loyola College (Chennai), Curriculo para programas de graduação. 2019


Martín, Eloísa. To open the sociological theory: geopolitics of knowledge and the non-canonical classical sociology. Departmento de Sociologia, Freie Universität, Berlin. 2017-2018.


Motta, Renata e Costa, Sergio. Global Sociologies. Departmento de Sociologia, Freie Universität, Berlin. 2018-2019.


Panjab University Chandigarh (Paquistão). Contemporary Issues in Sociology. Department Of Sociology, Panjab University (Chandigarh), mestrado em sociologia. 2017-2018.

Pinheiro, Claudio e Levitt, Peggy. De-Centering and Re-centering Social Theory: Critical Pedagogies and Southern Social Thinking. UFRJ, Wellesley College, Harvard University.2019-2020

Pinheiro, Claudio e Levitt, Peggy. De-Centering and Re-centering Social Theory: Critical Pedagogies and Southern Social Thinking. UFRJ, Wellesley College, Harvard University. 2020-2021.

Rodgers, Dennis. Social Theory I: Classical and Contemporary Debates. Department of Anthropology and Sociology, The Graduate Institute, Genebra (Suiça).


Smith, Richard. Mídia, modernidade e pensamento social. Goldsmiths, Universidade de Londres. 2022-2023.







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